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Número de cirurgias bariátricas aumenta 85% em sete anos

Estimativa é 13,6 milhões de brasileiros precisem do procedimento

O número de cirurgias bariátricas realizadas no Brasil aumentou 84,73% ao passar de 34.629 em 2011 para 63.969 em 2018, segundo balanço feito pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Metabólica e Bariátrica (SBCBM).  Nos oito anos em que o levantamento foi feito, 424.682 pessoas fizeram a operação de redução do estômago, o que corresponde a 3,12% das pessoas que estão dentro do grupo de pacientes aptos e para quem há indicação de cirurgia (13,6 milhões em todo o país).

Segundo a Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), de 2018, do Ministério da Saúde, a obesidade afeta 18,8% dos brasileiros e mais da metade (55,7%) tem excesso de peso. Essas pessoas podem ter a qualidade de vida afetada por doenças como hipertensão arterial, diabetes tipo 2, alterações do colesterol e triglicérides, além de aumentar as chances de arteriosclerose, além de outras patologias.

“A obesidade tem que ser encarada hoje como uma doença. Não é falta de força de vontade, não é desleixo, é uma doença que não deixa a pessoa emagrecer. Existe um desequilíbrio entre a sensação de fome a de saciedade e com isso a pessoa come mais do que deveria ou mesmo comendo pouco gasta pouca caloria e vai engordando ao longo da vida”, explicou o cirurgião bariátrico e membro da SBCBM, Admar Concon Filho.

Os dados mostram ainda que, das 63.969 cirurgias bariátricas realizadas em 2018, 77,4% foram através de convênio médico; 17,8% foram pelo SUS (Sistema Único de Saúde) e 4,8%, com recursos particulares. “Algumas pessoas não têm acesso, seja pelo local onde moram, por não terem um convênio médico ou outros motivos; outras têm medo de fazer o procedimento e outras não têm informação mesmo. Para outras, falta que o próprio indivíduo obeso se reconheça como portador de uma doença crônica incurável”, disse.

Outro motivo que afasta os pacientes da cirurgia é o medo. Segundo Concon, no passado a taxa de mortalidade ficava em torno de 2% a 3%, enquanto hoje é feita por videolaparoscopia e passou a ser minimamente invasiva, deixando a taxa de complicações semelhante à de uma cesárea ou uma cirurgia de vesícula, que é de menos de 0,5%.

“A população não sabe disso, então é preciso uma campanha muito grande de conscientização. Hoje já se sabe que o melhor tratamento para a obesidade mórbida é a cirurgia bariátrica, porque no tratamento clínico conservador o emagrecimento é muito pequeno e a recidiva é muito alta. A chance do obeso que não opera morrer pela obesidade é muito maior do que a chance de morrer pela cirurgia”, disse.

A cirurgia bariátrica é indicada para aqueles que tem obesidade por mais de dois anos, que tenham tentado o tratamento clínico com o endocrinologista ou com o especialista em obesidade para emagrecer e não obteve sucesso. “Nós levamos em conta o IMC (Índice de Massa Corpórea) que é calculado com base no peso e na altura da pessoa. O IMC de 40 para cima tem indicação de cirurgia e aquele que tem de 35 para cima, mas já tem doenças provocadas ou agravadas pela obesidade, também tem essa indicação”.

Concon destacou ainda a importância de o paciente ser acompanhado por uma esquipe multidisciplinar formada por psicólogo, nutricionista, endocrinologista, cardiologista, preparador físico, enfermeira, fonoaudióloga. “Ele tem que ter a consciência de que vai ter uma ferramenta que vai ajudá-lo a emagrecer, mas ele tem que ter sua participação, seguindo todas as recomendações do pós cirurgia, incluindo o acompanhamento do endócrino para o resto da vida, porque a doença obesidade continua lá”.

Por meio de nota, o Ministério da Saúde informou que as cirurgias bariátricas são recomendadas nos casos em que o obeso mórbido não consegue emagrecer com dieta, sendo o último recurso para esses casos. O procedimento é permitido somente para aqueles que passaram por avaliação clínica e acompanhamento com equipe multidisciplinar por, pelo menos, dois anos, observando se os resultados obtidos na preparação foram positivos.

“O SUS oferta cirurgias bariátricas e reparadoras aos cidadãos maiores de 16 anos diagnosticados com obesidade grave desde 2008.” O Sus já oferecia cinco tipos de cirurgias bariátricas e incorporou a técnica da gastroplastia videolapariscópica. “Técnica menos invasiva, que possibilita a perda de peso tanto por uma diminuição do tamanho do estômago, quanto por uma diminuição da superfície intestinal”, disse o Ministério da Saúde.

Segundo dados do Ministério, em 2018 foram realizadas 11.402 cirurgias bariátricas que tiveram custeio federal na ordem de R$ 72,9 milhões. Até o mês de maio de 2019 foram realizados 5.073 procedimentos em todo o país e o custo já chega a R$ 31,5 milhões. Os valores são repassados às gestões locais que monitoram a lista de pacientes que farão cirurgia bariátrica, com base na indicação médica.

O Ministério esclareceu ainda que para ajudar a adoção de uma alimentação mais saudável, a pasta disponibiliza o Guia Alimentar para a População Brasileira e o livro Alimentos Regionais Brasileiros, que trazem informações e orientações para facilitar a adoção de escolhas mais adequadas, baseada principalmente no consumo de alimentos in natura ou minimamente processados.

“O Brasil também se comprometeu a reduzir 144 mil toneladas de açúcar de bolos, misturas para bolos, produtos lácteos, achocolatados, bebidas açucaradas e biscoitos recheados, seguindo o mesmo parâmetro do feito para a redução do sódio, que foi capaz de retirar mais de 17 mil toneladas de sódio dos alimentos processados em quatro anos”, diz a nota.

Para pacientes, bariátrica é alternativa para quem já tentou de tudo

Para a maioria dos obesos, a cirurgia bariátrica é a última alternativa para emagrecimento. A designer de interiores, Michelle Monteiro Sartori, 34 anos, fez a cirurgia há um ano e contou que começou a sofrer com a obesidade quando entrou na adolescência e começou a engordar. Para emagrecer tentou de tudo: passou pelo médico endrocrinologista, psicólogo, fez plano de academia, tomou shake de emagrecimento, mas nada disso resolvia o que ela considerava um problema.

“Eu cheguei aos 110 quilos, com 1,70 metros de altura. Estava extremamente depressiva e sem energia física para fazer as tarefas do dia-a-dia. Tudo era difícil. Subir uma rampa, ir até a portaria do prédio, pegar minha filha no colo. Isso me afetava psicologicamente e eu ficava pior ainda. Para tentar emagrecer fiz tudo o que todo mundo que é acima do peso tenta”.

Depois de todas as tentativas frustradas, Michelle começou a pesquisar sobre a cirurgia um ano antes de tomar a decisão de passar pelo procedimento. Nos seis meses anteriores, participou de reuniões de orientação e esclarecimento sobre o processo e foi lá que chegou  à conclusão de que era o que queria e precisava.

“Desde a cirurgia emagreci 40 quilos. Hoje peso 70 quilos, faço exercício, como muito mais saudavelmente, passei do [manequim] tamanho 54 para o 42 e a vida mudou completamente. Para mim não tem mais obstáculo. Vou para todos os lugares a pé e não uso o carro para quase nada. Não só porque gosto de andar, mas porque hoje eu consigo e isso faz toda diferença na vida de qualquer pessoa”, disse.

Michelle diz que pensou também na parte estética, mas não foi esse o foco. A decisão veio para buscar a cura psicológica, já que o peso excessivo causava depressão e ansiedade, doenças que melhoraram ao longo do processo de perda de peso. “Tanto eu quanto o psiquiatra percebemos que foi um divisor de águas. Eu descobri também que existem outros prazeres, além da comida. A gente se apega à comida, porque quando se está obeso não se enxerga outra coisa além de comer, porque muitas vezes é o único prazer que a gente tem”.

Com a jornalista de 36 anos, Paula Bastos, a história foi um pouco diferente. Apesar de a intervenção também ter sido a última alternativa encontrada, ela já estava sentindo os prejuízos da obesidade na saúde física, quando foi detectado um pré-diabetes e logo depois uma hipertensão. Com isso, chegou ao limite e decidiu fazer a cirurgia.

“Eu sempre fui gorda, nunca tive uma fase mais magra. Quando descobri que estava a um fio do diabetes comecei um tratamento superintenso para tentar perder peso, mudar meu metabolismo. Fiz o tratamento por dois anos, mas depois das crises de hipertensão, comecei a considerar a cirurgia bariátrica como uma opção”.

Entretanto, ela teve que mudar a mente já que até então acreditava que se render à bariátrica seria sinal de fracasso e falta de esforço. Depois de conversar com pessoas que passaram pela experiência encontrou o médico ideal e segurança. “A cirurgia foi a melhor coisa que fiz na vida. Ela operou não só meu corpo físico, mas minha mente”.

Próxima de completar um ano de cirurgia, Paula conta que mudou hábitos e alerta aqueles que pensam que esse é o caminho mais fácil. Depois do procedimento é preciso disciplina, acompanhamento médico e psicológico constantes, além de cuidados para a vida toda. Destaca ainda que é preciso “autocontrole e força de vontade”. Atuante nas redes sociais, faz questão de contar suas experiências de maneira consciente. Não incentiva a bariátrica, mas mostra a realidade de ser obesa, os motivos que a levaram ao procedimento e deixa claras todas as dificuldades.

“Não adianta fazer a bariátrica, emagrecer por um tempo, chegar ao objetivo e mudar sua vida para não recuperar o peso e jogar a cirurgia no lixo. Eu sempre falei que as pessoas devem ser felizes e se amar independente do corpo que têm. Nunca fiz apologia à obesidade, sempre falei sobre meus próprios incômodos e em como eu estava tentando melhorar minha saúde. Sempre defendi que todos merecemos ter emprego, respeito, roupa para usar, possibilidades. Temos que viver com nosso corpo, mas procurar sempre viver melhor, seja como for para cada um”, afirmou.

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